Estou no limbo. Não sei ainda se sou um
felizardo ou um sobrevivente. A bandidagem da qual fui adepto ainda me
persegue. Na realidade, eu é que a persigo. Gosto de lembrar do que fiz, mas,
pelo meu atual estado de putrefação física e mental, jamais voltarei a fazer. Sou
um bandido mesmo, literalmente. De alta classe, colarinho branco e tudo, mas um
bandido. Com prazer total em ser. Na veia, na essência. Tinha casa grande, esposa
bonita e amigos fiéis ao meu esquema, que fariam tudo por mim. Hoje estou
abandonado. Um grande marginal, histórico, abandonado e falido.
Não me arrependo de nada do que fiz na vida. Acho
que é por isso que ainda estou aqui, firme e forte. Quer dizer, nem tão firme,
nem tão forte. Mas esse não é o ponto. O ponto é que, ao contrário dos meus
colegas do ramo, não dei pra trás. Não fraquejei. Não me arrependi de ser quem
fui. Aliás, de ser quem sou. Na minha área de atuação, não existe “ex”. Se
fisicamente eu não posso mais trabalhar, não quer dizer que eu não pense como antes.
Sou um caçador.
Os meus comandados costumavam me respeitar.
Sabiam quem era o chefe. Quem, de fato, mandava prender e mandava soltar. Uma
metáfora, claro. Mais ou menos. Eu devia ter sido preso por tudo que fiz. Mas
não fui. Paciência. Não mancha o meu currículo. Pelo contrário, eu acho. Mostra
como fui bom nesse negócio. Muito bom. E agora estou aqui, definhando aos
poucos a minha natureza para tentar me convencer de que a vida valeu à pena.
Que o meu estado atual é normal da idade, que não é castigo de Deus.
Depois de tantos anos, fico aqui refletindo se
valeu à pena. Se fiz tudo aquilo que sempre sonhei. Será que era isso mesmo que
eu queria dela? Era isso que eu imaginava ao colocar aquela faixa? Foi isso que
eu projetei quando me sentei naquela cadeira pela primeira vez? E depois?
Quando eu saí, da forma que eu saí, foi justo? Podia ter sido melhor?
No fim das contas, não tenho resposta para
essas perguntas. Não sei dizer se foi bom ter sido o mais jovem Presidente da
República da história do país. Acho que teria sido melhor se eu não tivesse
saído antes da hora, sem aquele estardalhaço todo. Mas gostei dos holofotes,
pelo menos. Sou cara de pau, não cara pintada. Bem, não me arrependo de nada
mesmo.
Faria tudo de novo, ah, se faria.
Bons tempos, que não voltam mais. Não comigo.
Passei o bastão.
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