Vá
para aquele lugar. Tome naquele orifício anal. Na ponte partida, no rebento
parido pela prostituta. Vá para lá também. Mas não se esqueça, jamais, de ir se
copular. Falar palavrão é incrível. Mas com fineza e educação, parece ridículo.
E é mesmo. Perde a sua essência.
Linguistas
de todo o país (e provavelmente de todo o mundo) não sabem até hoje classificar
o palavrão na gramática. Também acho isso ridículo. Parece óbvio que todos eles,
independentemente de sua construção formal, são sinceras locuções adverbiais de
intensidade. Não?
Ora,
antes de mais nada, devemos concordar: soltar aquele palavrão é libertador. Dá
aquela lavada na alma. Você pode estar feliz, muito feliz, feliz pra caramba. Ou
então, muito chateado, com raiva, enfurecido. Tenha certeza: daí, cedo ou tarde,
sairá um palavrão. Com sonoridade musical e tudo. Como um arroto moral,
expirado a plenos pulmões recheados de emoção.
Mas
vocês sabem o que é um porre? Forçar a barra, fazer um lobby aqui e ali, em
prol de uma palavra tola, às vezes até discreta, para o seleto rol dos
palavrões, em atenção “aos bons costumes”. Já mencionamos “arroto” (que alguns
lunáticos tacham de palavrão). Outros clássicos exemplos são “escroto” e “cacete”,
que obviamente não merecem a alcunha. Essas palavras estão ali, na delas, não
fazem mal nem a um mosquito. Há tantas outras, de igual sentido, com maior
intensidade. Mas tem gente que teima em superestimar essas leves e poéticas
palavrinhas.
O
que temos de lamentar é o vai e vem por causa da nova safra. São os palavrões
mais jovens tomando o lugar daqueles que sempre nos serviram, na medida certa
do colarinho. Agora “chupa” virou palavrão. Assim como “WTF” (what the fuck, melhor informando), que
também (supostamente) galgou seu lugar ao sol no inferno das palavras,
principalmente por conta da ira dos jovens rebeldes da internet, que amam
demais e xingam demais, com palavrões (de raiz) de menos. Cadê a velha guarda
dos palavrões, minha gente? Deve ter ido para aquele lugar onde só tem fezes.
Que injustiça. Quero o meu “porra” de volta!
Ah,
o bom e velho “porra”. De tão usual para qualquer tipo de frase ou pessoa
(quase todas as idades), em qualquer momento ou sensação, seja bom, ruim ou
nada, tornou-se uma palavra comum. Caiu no ostracismo. Uma pena.
Possuo,
de certa forma, uma história com o “porra”. Está na minha formação como pessoa.
Uma vez, meu avô me repudiou, quando criança, por ter falado “porra”, sendo que
eu tinha falado apenas seu apelido, o popular “po”. Foi um grande sermão: disse
que no tempo dele era inaceitável falar isso em público, que eu era menino
direito, educado, limpinho, cheirosinho etc etc etc. Naquele dia, senti que “porra” era um palavrão
de respeito. Isso nos velhos tempos. Hoje é o América dos palavrões. Grande
América, diria meu avô, em homenagem ao tempo em que se amarrava cachorro com
linguiça.
Falando
em linguiça, agora imaginem vocês um diálogo de boteco. Interlocutores com seus
chinelos de dedo, tomando aquela gelada e petiscando aqui e ali só para
acompanhar. Seria algo mais ou menos por aí:
-- Porra,
como é que o Robertinho casou e você não me contou? Você é um belo de um filho
da puta!
--
Ah, vai à merda, vai. Problema é teu que não está nem aí pra porra nenhuma. Se
fodeu.
-- É
problema meu mesmo, porra. Foda-se.
--
Corroda-se.
--
Nossa, maduro pra caralho.
--
Grosso também. O meu caralho.
--
Tomar no cu, porra.
-- Vou
com a tua mãe.
-- Foda-se.
--
Corroda-se.
E
assim a discussão iria até o sol raiar. Papo duradouro, cerveja ingerida aos
montes, felicidade garantida pra todos pela posteridade (principalmente para o
dono do bar). Nada mais simpático e divertido de se ler, não acham? Humanidade
é isso aí: escrever como se fala. Falar como se sente. Se sentir como bem
entender e que se dane o mundo.
Palavras
de baixo calão (ridículo, ridículo!) fazem isso com a gente: dão atestado de
liberdade. É como se estivesse escrito: “Fulano está apto a ser Fulano mesmo”.
Então fale. Solte. Pule. Grite. Sussurre. Cutuque e mande na lata.
Mas
o espaço é democrático. Nem todo mundo gosta dessa leveza toda (ou peso,
dependendo do ponto de vista). Pode ser tudo muito chocante. “Essas palavras
más! Para quê falar assim?”, pensam alguns muitos.
A
rigidez, a beleza da norma culta e pura da língua, a boa educação dos bons
samaritanos merecem nossa menção honrosa, claro. Não nos esqueçamos deles,
então. Com toda a nossa simpatia e política da boa vizinhança no campo fértil
dos argumentos, já traduzindo para a sua melhor compreensão, com carinho,
mandamos a nossa mais singela homenagem: vão todos tomar em seus respectivos
orifícios anais!
A
mensagem é polida e sincera. Assim não corremos o risco de a hipocrisia se
difundir, já que tomar no cu não reproduz a espécie.
Com ou
sem porra.