A
vida passa como um filme na mente. À volta não há ninguém acreditando. Não
conseguem digerir. Mas alguém destoa. A moça ao lado está em choque. A ficha
não caiu para ela. Berros, sussurros e desespero por toda a parte. Ninguém se
controla. Menos a moça ao lado. Impassível. Imexível. Indestrutível. Perdida no
caos.
Dois
minutos.
O
filme na mente já está acabano. É um curta-metragem, interrompido pelo destino.
O ambiente está carregado de fé. Carregado de arrependimento, de indulgência.
Deus passa a ser aclamado. Todos se unem numa energia, naquela força salvadora.
Um só pensamento no objetivo. Mas a moça ao lado continua na dela, do seu modo
frio e curioso. Ela está na fé também. Só pode estar. Reação apaixonante.
Curiosa e atraente.
Um
minuto.
A
fantasia começa a tomar forma. Tudo parece ilusão. Realidade agora é uma
mistura de imaginações perdidas com um pretérito futuro que jamais virá a ser presente.
Um ciclo infinito. Louco. Incompreensível. A moça ao lado já nem me chama mais
a atenção. A sua ausência se tornou costumeira nos últimos tempos. Tempos
difíceis. Sons já não são mais absorvidos. A pressão não é mais mera impressão.
Nada mais faz sentido.
Trinta
segundos.
A
moça ao lado começa a se mexer. Finalmente. Resolvo tocá-la. Um pouco de
carinho a essa altura não custa nada. Dou-lhe um beijo e sou correspondido.
Sinto ser nosso último suspiro de vida. Um sincero suspiro. Um suspiro do amor
perfeito. Sorrio com a ironia do destino e reflito se afinal aquilo não seria
um final feliz para a minha vida.
5
segundos.
Vida
que está se deteriorando a cada milimétrico grão que cai na ampulheta ainda
mais diminuta. Que foi sentenciada à morte, sumariamente, após a notícia
cortante que recebemos. Que iniciou o seu fim há dois minutos e cinquenta e
cinco segundos, quando o piloto, trêmulo, decretou: “senhoras e senhores,
lamento informar. Uma de nossas asas se rompeu. Não há nada a fazer. Que Deus
nos proteja”. Chorou como um neném. Um ato involuntariamente irônico para a
hora do adeus. No início e no fim, o choro. E o ciclo da vida se fechou.
Zero.
É o
fim. O cordão umbilical com o mundo se rompeu. Lá se foi a minha vida. Lá se
foram os três minutos mais intensos dela. Outra ironia involuntária. Também
chorei. Olho para o lado, e a moça, aquela mesma, está igualmente em prantos.
Nossa dor se mistura. Já não era sem tempo.
O
filme que passou na minha mente, então, teve um final feliz.