terça-feira, 22 de maio de 2012

Julieta & Romeu

O metrô não é bem um lugar para se conhecer novas pessoas. Mas às vezes não tem jeito. Como frear o acaso? Como obstruir o que o destino tratou de juntar? Não dá. E foi assim que eles subitamente se conheceram, ao se sentar lado a lado num vagão qualquer:

- Bom dia, senhorita.

- Hãn?! Bom dia.

- Por que tanta surpresa e secura ao me responder, adorável criatura?

- Só respondi “bom dia”, sei lá. Estamos no metrô. O que queria mais?

- Um sorriso, talvez. Um desabrochar de sua face para esse belo dia que está começando. Ou, na melhor das hipóteses, para mim. Seria um privilégio, devo confessar.

- Nossa, você tem muito bom humor de manhã.

- Não é questão de humor. É questão de sobrevivência. Amo a vida. Não sobrevivo sem ela. Sem amá-la. Sem sorrir para ela. Devia experimentar.

- Tudo bem. Se você assim diz, então não vou discordar. Estou com sono.

- Discorde, senhorita. Sua beleza certamente vai além do rosto de perfeita simetria. Tenho convicção de que se trata de uma brilhante dama.

- Você está dando em cima de mim ou o quê?

- Imagine só! Isso não são modos para um cavalheiro como eu.

- Pensei. Tive essa impressão. Que absurdo ter imaginado algo do tipo.

- Ora, mas a senhorita é muito objetiva. Muito direta, mas também irônica. Gosto disso. Dois pontos são ligados por uma reta. A senhorita vai direto ao ponto.

- Viu só?! Está dando em cima de mim sim.

- Apenas constatei, minha cara. Entre o branco e o preto há milhares de tons.

- Às vezes não entendo nada do que você me fala. Parece estar viajando.

- Claro que estou. A vida é uma longa viagem. Não acha?

- Não sei. Nunca parei para pensar nisso.

- Pois então pense. Divague. Voe. As portas irão se abrir. Principalmente as portas do seu coração e da sua mente. Mas acho que a senhorita já viajou sim.

- Que conversa mais profunda para uma hora dessas. Por que você não lê um jornal ao invés de ficar aqui sonhando acordado?

- Por quê? Simples, minha querida nova amiga. Porque sonhar é enxergar um mundo muito mais doce, de grandes oportunidades. A pergunta é outra: por que não sonhar?

- Bem, vou pensar mais tarde no que está falando, mas acho que não concordo muito. Isso não é pra mim. Sou realista demais. Gosto de fatos, não sonhos.

- Claro que concorda. Só não vê da forma como eu enxergo. O fim é o mesmo. Vejamos: todo dia a senhorita acorda pensando num propósito. Sai de sua casa cheia de planos, mas sabe que o imponderável às vezes atua. E principalmente: sabe que o que te move é a vontade de sempre melhorar, evoluir.

- Nunca tinha parado para pensar dessa forma. Acho que tem razão. Sou assim mesmo.

- Não falei? Viajar é preciso. Os longos voos nos fazem pousar numa pista concreta de criatividade, de vida, de felicidade.

- Imagino que sim. Bem, chegou na minha estação. Tome meu telefone. Me ligue quando puder.

- Obrigado, senhorita. Adoraria prolongar nossa conversa numa outra ocasião. A propósito, qual o seu nome?

- Ah, é claro! Nem nos apresentamos. Meu nome é Prosa.

- Muito prazer. Me chamo Verso.


E assim, daquele dia em diante, tudo ficou muito claro. Os dois, apesar das diferenças, jamais andariam separados. Se tornaram grandes companheiros, enamorados, e é certo que viverão lado a lado até o fim de nossos dias.

Porque, no dia em que não mais existirem, acabará o sentido da vida de todos nós.


 
                                      
                                                 
                                                  Ilustração: http://desenhoscomgosto.blogspot.com.br

quinta-feira, 17 de maio de 2012

Dois Cliques de Uma Mesma Moeda


 A vida é uma correria. Minha vida é uma correria. Um piscar de olhos, e tudo vira nada. Não é fácil.
Meu nome é Alexandre. Sou fotógrafo profissional especialista em seguir celebridades. Sim, sou exatamente isso que você está pensando. Sou um autêntico paparazzi. E dos bons.
Não pense que é tranquilo seguir famosos. Não é mesmo. Essa gente é muito temperamental, não nos deixa trabalhar e, em alguns casos, ainda nos ofende. Não queriam aparecer ué? Então pronto. É o que eu sempre digo: “ajoelhou, então vai ter que sorrir”. É o preço que se paga pela fama. Eu acho.
Mas tente colocar isso na cabeça de uma “estrela” pra você ver. É quase impossível! O que posso fazer se o povo gosta de ver essa gente na praia, na padaria ou no shopping fazendo compras? Pois então tenho que correr atrás, não é? É o meu ganha-pão. É o meu dever como profissional. Não tenho afeto para dar. Só cliques e flashes.
Ih, olha lá a Suzane Brandão tomando água de coco. O público vai adorar. “Sorria, Suzane!”. Flash.


Não aguento mais. Estou à beira de um ataque de nervos! Qual é a graça que as pessoas veem em me seguir? Pra quê isso? Esse pessoal está passando dos limites. Também tenho vida própria. Será que tenho mesmo vida própria?
Sou a Suzane Brandão. Claro que você já me conhece. Mas não sei se isso é bom. Às vezes gostaria de passar despercebida. Gostaria de um dia poder viver livremente. Estou cansada.
Como é que eles querem que eu fique distribuindo sorrisos o tempo todo? Às vezes não estou a fim, caramba! Sou uma atriz, interpreto papéis, mas também sou ser humano. Sou mesmo um ser humano? Tanta gente me desejando, me bajulando e se importando comigo que já nem sei mesmo o que sou. Sei lá.
É muito exagero dessa gente. O assédio, os gritos, tudo. Só a privacidade que não. O que esses perseguidores com habilidade ninja querem de mim se não tenho a minha liberdade?
Ah não. Lá vem outro me “flagrar”. Não posso nem tomar minha água de coco em paz. Acho que vou mandar o meu dedo do meio fazer uma participação especial nessa foto. Essa é clássica. Afeto?! Isso eu não tenho para dar. Flash.


                                     Foto retirada do site http://www.techguru.com.br

domingo, 6 de maio de 2012

A Lei do Mais Idiota


Cada vez mais tenho certeza de que vivemos num estado permanente de bang-bang. Tudo parece que se “resolve” na base da violência. Do tiro para assassinar. Da facada para ferir. Da porrada para bater na cara mesmo, sem frescuras, sem escrúpulos. Sem cérebro também. Lamentável e animalesco. Um espetáculo trágico e atual da nossa vida real. Um ciclo sem fim, porque gotas de sangue e narizes quebrados não modificam nada na prática.

A teoria darwinista da evolução aponta que o homem se desenvolveu de um status originalmente primata. Parece senso comum a ideia de que viemos do macaco, ou seja, de que éramos completos animais para nos tornarmos o que somos hoje. Mas o que somos hoje, na realidade? Não tenho tanta certeza assim sobre a nossa humanidade.

O tempo vai passando, os anos vão andando, passam-se décadas, séculos, milênios, e o ser humano teima em ver o uso da força, da briga bruta e física, do fogo queimado, como um objetivo para mostrar quem manda no pedaço. Um aviso. Uma execução. E a vida continua. Cavernas, guerras, trevas, bárbaros e mais guerras. Aquela ideia de que evoluímos do macaco não me parece muito exata. Parece que os instintos animais, para muitos de nós, são ainda mais ativos do que o privilegiado uso do cérebro que deveríamos preservar.

Não sou daqueles pacifistas nem candidato a Miss Brasil para querer a paz mundial. É utopia, claro. Muita gente gera muitos interesses, divergências, brigas, impulsos e, é claro, idiotas. Porém nunca me convenceu (e acho que nunca me convencerá) a utilização da força para resolver problemas. Como se a pancada fosse o fim em si mesmo. O alcance do objetivo. O importante é machucar, ferir, matar. Que se danem as consequências. Qual é, então, a nossa diferença para os animais? Difícil perceber. Acho até que estamos em desvantagem.

Um exemplo do uso da força a troco de nada pode ser percebido em shows, micaretas e boates de todo o país. Se não fosse algo tão comum e reiterado, seria chocante pararmos para analisar como homens, em um elevado percentual, fazem para se aproximar das mulheres nessa ocasião. Muitos deles primeiramente olham como se fosse uma presa. É o tal instinto animal. Depois tentam uma ação mais agressiva, às vezes puxando o cabelo, às vezes agarrando a cintura. Toda vez que vejo cenas assim me pergunto: como alguém pode achar isso certo? Como não perceber que é um tremendo desrespeito? Esse cara não tem mãe?

Outro exemplo de violência bruta, mas bem mais grave, de proporções trágicas, são as brigas envolvendo torcidas de futebol. Toda semana há notícias de brigas e até mortes, não só no Brasil, mas nos mais variados países, indo do Egito à Inglaterra. Tudo bem, o futebol envolve paixão, emoção, impulso. Eu sei disso, também sou grande fã do esporte, mas há um limite. Tem uma hora que devemos parar para pensar e usar a nossa consciência. É para isso que a temos. Será que essa galera que se mete em briga para pra pensar na imbecilidade (não vejo outra palavra) que estão fazendo? O que se passa na cabeça dessa gente? Deve ser algo do tipo  “vou bater pra...hmmm...ah, sei lá!!!! Porrada!!!!!”. Deve ser isso.

Não sou uma pessoa exatamente religiosa, mas acredito em Deus. Acredito numa força divina e superior. Mais do que uma certeza concreta (obviamente nunca estive em Sua presença), crer dessa forma é um conforto. Como não torcer para que o cara que executou outra pessoa à mão armada por mero interesse material não seja punido, lá na frente, num plano imaterial? É um consolo, pelo menos.

Não deixa de ser irônico misturar duas crenças tão distintas. Começamos o texto com os homens-primatas de Darwin para terminar com a fé de que Alguém lá em cima está olhando por nós e aparando as arestas. O fato é que acreditar nisso minimiza o vazio que sinto ao tentar entender o que se passa com essa gente. Porque, na verdade, não entendo mesmo. Jamais vou entender e estou escrevendo para compartilhar o meu desentendimento sobre essa aberração da consciência humana. Me ajudem. Haja força para evoluir. Haja fé para acreditar. Amém.